Bem vindos!
Aproveitando o ensejo do Alberto,
que dissertou sobre Uriah Heep, darei minha humilde contribuição, enriquecendo
o cardápio de álbuns a serem ouvidos.
Uriah Heep é o tipo de banda que demora
a chegar até você e te deixa puto por ter vivido cego, na ignorância por tanto
tempo. Novamente o culpado foi o senhor Alberto, que me apresentou fragmentos
de Damons & Wizards. Sinceramente minha vida nunca mais foi a mesma depois
deste dia. Eram os teclados de pura tensão? A guitarra mal-intencionada? Os
vocais sublimes? É tudo isso ai mesmo. E então veio a música The Magician’s
Birthday. Tudo nela é perfeito. O baixo que joga contra de Gary Thain, a voz
aguda de David Byron, a guitarra de Mick Box e seu solo matador, a boa levada
de Lee Kerslake e, por fim, Ken Hensley com teclados insanos.
E o enigma do dia é: o quê há na
água de Birmingham que criou bandas tão foda (com perdão do verbete)? É isso
mesmo colegas, esta é mais uma das bandas da comarca sabática. Deveria ter
algum portal aberto da sexta dimensão. Quem sabe? Neste post falarei sobre mais
um álbum ao vivo, vocês já conhecem minha predileção por eles. E lá vamos nós!
A introdução não conta, então
vamos direto a Sunrise. Começo
enigmático, os tímpanos reverberam aos vocais agudos e bem afinados, aliados ao
timbre louco de Ken Hensley nos teclados. A guitarra é outra coisa que
impressiona, pois é muito pesada para os padrões da época. É pessoal, Uriah
Heep é metal dos bons em pleno começo dos anos 70. Escute a voz de “Lord” Byron
e me diga se ele não é inspiração para a maioria dos cantores de metal da
atualidade?
Sweet
Lorraine traz a mesma proposta de teclado de Sunrise. Inspirada na
homônima de Nat King cole? Acho muito difícil! É a representação da
versatilidade da banda, que sempre que pode, intercala Boogie Woogie com magia
negra celta, e, neste caso ainda encontrou tempo para colocar um pouquinho de
funk na guitarra de Mick Box. É fácil de perceber isto, quando aos dois minutos
de música, Ken Hensley entrava a banda com sua ingerência nos teclados e
transforma o som.
Traveller
In Time continua a proposta das duas primeiras, muita bordoada na
cara, em todos os instrumentos. Injeções de calmaria bem pontuais por Sir.
Byron. O requinte de crueldade está nos minutos finais, quando Lee Kerslake
desce o cacete na caixa e dá início a um riff extremamente simples, mas mortal.
Guitarra e teclado conversam e se tornam iguais. David Byron dispara seus
agudos de novo. Que petardo!
Não tem vida fácil, não! Easy Livin’ é um dos maiores clássicos ao lado
de Lady In Black. É uma das músicas que mostra mais a personalidade da banda,
sempre que a escuto, não consigo me lembrar de nenhuma banda que tenha feito
algo parecido. A dupla Box/Hensley foi
uma das melhores coisas que aconteceram para a música, não consigo pensar em
heavy metal nos dias de hoje sem lembrar-se deles. E fazem isto com muito
pouco, a melodia desta faixa é deliciosamente simples, porém tocada com todo o
efeito e empolgação da banda são imbatíveis.
E agora um dos grandes momentos do
disco. É não existem palavras para descrever o que senti quando ouvi July Morning pela primeira vez. Perfeito, acho
que esta é palavra. Como disse no parágrafo anterior, não há nenhuma
genialidade ou complexidade extrema nos arranjos instrumentais da banda, mas o
jeito que são feitos, como são combinados guitarra e teclado, trovando com o
baixo de Gary Thain, além das grandes interpretações de Byron, nos fazem crer
que tudo está perfeito. A viagem aqui não tem fim. Posso elencar dois momentos
que são os mais importantes, o riff inicial, amuado e simplório do teclado que
inicia a coisa toda. E depois, a violência de guitarra e teclado no recheio da
música, que travam uma batalha épica, utilizando os mesmos golpes, as mesmas
notas e força. O intermediador desta batalha é Byron, que grita alto e agudo,
mas eles não querem parar. Não é bem um solo e nem tampouco é um riff, este é o
jeito Uriah Heep de fazer música. E, assim como Sabbath, foram um dos
introdutores das notas consideradas demoníacas pela igreja católica. Pegue o
caderninho de novo ai meu filho e coloque esta como uma das melhores da sua
vida!
Um pouco de rock ‘n roll e blues
para limpar a sujeira deixada por July Morning. Tears
In My Eyes é o jeito Uriah Heep de abordar a música negra americana.
Este timbre de guitarra estalado pelo Wah Wah de Mick Box com slide é a
manifestação realística da ultraviolência do filme Laranja Mecânica. David
Byron até tenta apaziguar, de novo, em vão, com um “nananananana”, porém não dá
certo. Desista Mr. Byron!
Em tempos distantes, o amor
cigano era retratado acusticamente, em forma de tangos, bulerias, tragédias
etc, entretanto, nem todos partilham da mesma predileção. Gispy é a manifestação sintética e diabólica
do quinteto para este amor impossível e sui generis. A guitarra faz o papel de
acompanhamento, tipo bife à parmegiana que vem com batatas. É gostosa, mas não
é necessariamente o que queremos. O prato principal é o teclado de Ken Hensley,
constante e estridente como todo o soar do grupo. O sintetizador Moog é a
novidade, ele aparece na maioria das músicas pregressas, porém nesta faixa está
em evidência, materializando todos nossos sonhos e paixões, com este gosto de
molho de tomate e queijo. Dá tempo ainda para um bom solo de bateria de Lee
Kerslake, um grande show dos anos setenta sem este recurso não existia.
Uriah Heep também sabia fazer
letras profundas, que falam de morte e coisas do além túmulo, isto não é
monopólio do Led. Circle Of Hands foi
acusada por alguns de ser muito parecida com July Morning, por ter uma forte
entrada de teclado, vocais agudos e grande instrumentalização. Acho que este é
o tipo de crítica destrutiva, pois joga à mesmice o que podemos chamar de
personalidade musical da banda. Seria o mesmo que acusar o Deep Purple de ter
riffs grudentos. O destaque fica para Ken Hensley, que novamente formata a
música ao seu gosto, enchendo de teclados, com efeito, e misticismo nas letras.
Look
At Yourself tem isto tudo que falei acima, no entanto, esta versão
tem um algo a mais da de estúdio. Quem a canta no álbum de mesmo nome é Ken
Hensley, já no Live 73’ é Byron que faz essa tarefa, resumindo, consertaram a
cagada. Nada contra os vocais do tecladista, mas David é uma das almas deste
grupo, escute ele interagindo com a platéia e gritando à la Ian Gillan. O solo
de guitarra sujo, meio errado, com bastante Wah Wah foi com certeza uma das
influências para as bandas grunges, principalmente Soundgarden.
Magician’s
Birthday foi tipo um “parabéns para você” de empresa, curtinho, nem
deu tempo de chegar no: “E pro Fulano nada... tudo!”. Triste, adoro essa música
=(
E na máquina do amor nos
divertimos. Love Machine é curtinha
que nem Easy Livin’, outra bordoada. Riff principal bem simples, três ou quatro
notas no máximo e muita distorção na guitarra e piano, deixando a música muito
suja. Esta era o tipo de canção que a banda aproveitava para dar show, fazer
caras e bocas e empolgar os presentes.
E por fim um pout pourri para a
galera. Rock ‘n Roll Medley junta as
músicas: Roll Over Beethoven/Blue Suede Shoes/Mean Woman Blues/Hound Dog/At The
Hop/Whole Lotta Shakin' Goin' On. Em linhas gerais é um pouco avessa à
sonoridade da banda, que perambula pelo profundo, taciturno e ocultismo, por
tanto, sentimos certa dureza nas linhas instrumentais, todavia, a afinação e
sincronia na execução dos vocais nos mostram a força colaborativa da banda,
trabalhando como uma unidade celular. Por isto, sempre quando penso em Uriah
Heep, nenhum membro em específico me salta a mente, todos fazem seu papel, sem
atravessar ninguém. Um jeito lúdico e entusiasmado de encerrar este ótimo
registro ao vivo. Destaque para os uivos na parte de “Hound Dog”.
Concluindo amigos, Uriah Heep é
uma banda que passou por diversos momentos de sua história, sempre prevalecendo
os conturbados, como brigas, mortes etc. A formação de Live 73´ com certeza foi
a mais criativa e poderosa de todas elas, a sinergia demonstrada e a
intensidade de suas composições servirão de influência para muitas gerações
ainda. Este álbum é a síntese de tudo que o grupo construiu de mais glorioso em
sua história. O peso das distorções, tanto de teclado quanto de guitarra,
aliados aos belos e agudos backing vocals que serviam de pano de fundo para Lord Byron, talvez
nunca mais sejam feitos que nem os meninos de Birmingham faziam.
E por hoje é só!
Grande abraço!